Lutz Koch, Rommel, 1949

Koch, Lutz [1949]. Rommel. Lisboa: Editorial Asper, 5.ª ed., s/d. Col. “Grandes Biografias”, trad. Dídia Marques, 257 pp.

Militar de carreira, o meu pai acalentava uma especial admiração por alguns chefes militares. Um deles era, indubitavelmente, o Generalfeldmarschall Erwin Rommel (1891-1944), também conhecido como “Raposa do Deserto”, pelo seu papel no comando da força expedicionária alemã no Norte de África, Afrika Korps.

O livro que hoje vos trago pertencia ao meu pai e é uma biografia do marechal-general de campo Rommel, escrita por Lutz Koch e publicada, em Portugal, pela Editorial Aster, com tradução de Dídia Marques. Trata-se da 5.ª edição deste livro, mas que não está datada.

Afrika Korps vs 8.º Exército ou Rommel vs Montgomery

Desde criança que me lembro de ver este livro numa estante lá de casa. Mas nunca me despertou especial interesse: não tinha imagens e parecia-me demasiado massudo... No entanto, Rommel e o Afrika Kops – assim como Montgomery e o 8.º Exército – faziam parte do imaginário das minhas brincadeiras de criança, lá pela segunda metade da década de 1970. Nessa época, eu e os meus amigos devorávamos os livros de banda desenha da série “As Grandes Batalhas” de Pierre Dupuis e todos os números que iam saindo das revistas Combate e O Falcão, nomeadamente aqueles que tinham o luso-britânico Major Alvega como herói principal.

Na verdade, a Segunda Guerra Mundial era, para nós, a guerra por excelência, o combate supremo entre o bem e o mal. Todos torcíamos pelos Aliados, mas não deixávamos de admirar o equipamento e, especialmente, os uniformes alemães. A Campanha do Norte de África  fosse pelo exotismo do cenário do deserto ou pelas fardas e camuflagens cor de areia, ocre e caqui  exercia um especial fascínio sobre nós, rapazes entre o final da infância e o início da adolescência.

Regressando ao livro, o autor, Lutz Koch, foi jornalista e corresponde de guerra alemão. Viveu três anos de combates ao lado de Rommel, acompanhou-o e conversou frequentemente com ele. Terminada a guerra, passou outros três anos a estudar o chamado “caso Rommel”. Por conseguinte, o biógrafo apresenta-se como um conhecedor profundo do biografado, prometendo ser fiel à verdade: “descrevo os factos tal como os vivi ou tal como mos relataram testemunhas dignas de crédito” (p. 8).

Erwin Rommel (1891-1944) alistou-se no exército em 1910, deixou-o em 1918 e regressou em 1933. Inicialmente, esteve encarregado das relações com a Juventude Hitleriana. Em 1940, distinguiu-se no comando da 7.ª Divisão Panzer, durante a invasão de França. Entre 1941 e 1943, liderou o Afrika Korps, recuperando o terreno perdido pelo marechal italiano Rodolfo Graziani, na Líbia, empurrado os britânicos até El Alamein, no Egito, o que lhe granjeou a alcunha de “Raposa do Deserto”. No entanto, a posterior ofensiva do marechal Montgomery obrigou-o a recuar até à Tunísia.

Em março de 1943, foi chamado para inspecionar as defesas da Muralha do Atlântico, introduzindo numerosas melhorias naquele sistema defensivo. Nomeado comandante do Grupo de Exércitos B estacionados em França, não conseguiu evitar o desembarque dos Aliados na Normandia, em junho de 1944. A 17 de julho, o carro onde viajava foi atacado por um avião aliado. Gravemente ferido, foi hospitalizado durante vários meses. Durante a convalescença, recebeu a visita de dois generais enviados por Hitler. Afirmaram ter provas irrefutáveis do envolvimento de Rommel na conspiração que culminou na tentativa falhada de assassinar o Führer (20 de julho de 1944), deixando-o perante a escolha de responder em tribunal por tal crime ou suicidar-se. Rommel não hesitou em optar pelo suicídio. Poucos dias depois, no seu funeral, Rommel recebeu as mais altas honras militares, ocultando-se da opinião pública o seu envolvimento na intentona.

O branqueamento de Rommel e da Wehrmacht

Escrito em 1949, o livro faz a apologia de Rommel, descrevendo a sua evolução moral: inicialmente recetivo ao nacional-socialismo, o desenrolar dos acontecimentos foi semeando dúvidas no espírito do marechal, levando-o a expressar críticas e, finalmente, a tornar-se um adversário decidido de Hitler.

Rommel levou alguns anos para descobrir a verdadeira personalidade que se escondia sob a máscara de Hitler, pois a sua alma era muito pura para imaginar tão satânica monstruosidade. O seu carácter fortaleceu-se, não apenas nas batalhas que se travavam nos dois continentes, mas sobretudo na sua decisão de se rebelar contra o ditador. (p. 254)

Para além do material recolhido por ele em primeira mão, enquanto correspondente de guerra, Lutz Koch baseia-se também em artigos de propaganda de 1941 e 1942, na trilogia de livros sobre as campanhas do Norte de África (African Trilogy) de Alan Moorehead e nos relatórios dos Julgamentos de Nuremberga.

Nesta publicação, é clara a preocupação de Koch em defender a integridade do militar alemão, procurando branquear a sua atuação e separá-lo dos crimes cometidos pelos nazis. O marechal é apresentado como um génio militar isento de erros, sendo as derrotas imputáveis às más decisões de Hitler ou de Mussolini. Rommel surge como uma figura de culto, enquadrado num movimento mais vasto de branqueamento da atuação da própria Wehrmacht, dissociando a ação militar da ideologia nazi.

Por tudo isto, este livro deve ser lido tendo em atenção os reais intentos do autor, já que o seu envolvimento e admiração pessoal pelo biografado acabou, muitas vezes, por se sobrepor ao imprescindível sentido crítico.

Ficha técnica

  • Título: Rommel
  • Autor: Lutz Koch
  • Edição: 5.ª ed. s/d [1949]
  • Idioma: português
  • Tradução: Dídia Marques
  • Editor: Editorial Asper
  • Coleção: Grandes Biografias
  • Local: Lisboa
  • Encadernação: capa mole
  • Páginas: 257
  • Dimensões: 220 x 150

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