Indicadôr de utilidade pública: Pôrto, 1939
Indicadôr de utilidade pública: Pôrto, 1939. Porto: edição e propriedade: Agência Fulmina; composto e impresso: Tipografia Sequeira, Lda |
Começo estes posts no blogue Le Bouquin de Porto, precisamente com um antigo roteiro da cidade do Porto. Chama-se Indicadôr de utilidade pública: Pôrto, 1939 e tem um formato do género livro de bolso com 16 mm de lombada e – curiosidade! – as páginas não estão numeradas.
O Indicadôr começa com uma lista de “Chamadas de socorros”, onde figuram os contactos mais urgentes. Aqui encontramos, entre outros, o quartel do Carmo da GNR, com o número de telefone 121 (quase que era 112!); os Bombeiros, na época sediados em Gonçalo Cristóvão; a Câmara Municipal do Porto, estabelecida no Paço Episcopal, sendo dito “Em construção o sumptuoso edifício, na Praça do Município, para onde serão transferidos todos os serviços da Câmara” (haveria que esperar ainda quase duas décadas para que tal se tornasse realidade!); os comandos da 1.ª Região Militar e da PSP, ambos na rua Augusto Rosa, ao lado do Governo Civil; o comando da Legião Portuguesa, no n.º 160 da rua de Cedofeita; e a sinistra Polícia de Vigilância e Defesa do Estado (PVDE, que haveria de mudar para PIDE em 1945), na rua do Heroísmo, 329 (onde hoje está o Museu Militar do Porto).
Da sede da União Nacional à Messe de Oficiais
Parte significativa do livro é ocupada com a listagem das instituições de utilidade pública da cidade, devidamente ordenadas alfabeticamente: Advogados (são apenas listados sete, todos com telefone e quase todos localizados na praça da Liberdade ou na avenida dos Aliados); Agências; Albergues; Alfândega do Porto; Asilos; Associações (aqui encontramos a Associação Comercial do Porto, a Associação Industrial Portuense – agora AEP – e a União Nacional, partido único, com sede no 1.º andar do n.º 126 da rua de Passos Manuel – no edifício onde hoje está o Marcolino Relojoeiro); Arquivos; Automóveis de praça (táxis); Bairros (o Oriental, com sede na rua de Entreparedes, 61 – 1.º e que englobava as freguesias de Bonfim, Campanhã, Paranhos, Santo Ildefonso e Sé; e o Ocidental, com sede na rua de Cedofeita, 439 – 1.º e que incluía as freguesias de Aldoar, Cedofeita, Foz, Lordelo, Massarelos, Miragaia, Nevogilde, Ramalde, São Nicolau e Vitória); Bibliotecas; Bolsas (havia a Bolsa Agrícola, a de Mercadorias, a do Pescado e a Bolsa de Valores do Porto – agora não há nenhuma); Bombeiros; Cadeias; Caixas de crédito; Câmaras; Capitanias; Carreiras de camionetes; Casas de caridade e proteção a doentes; Casas de saúde; Cemitérios; Clubs desportivos e de foot-ball (eram 22, entre os quais o “Foot-Ball Club do Pôrto”, com sede na praça do Município); Clubes de recreio (havia cinco: Ateneu, Fenianos, Oporto British Club, Portuense e Suíço); Conservatórias; Consulados (eram 40 os países que tinham representação diplomática no Porto. Países da Europa: Alemanha, Bélgica, Dinamarca, Espanha, Estónia, Finlândia, França, Grécia, Holanda, Hungria, Inglaterra, Itália, Lituânia, Noruega, Polónia, Mónaco, Roménia, Suécia e Suíça. Países da América: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Cuba, Estados Unidos, Equador, Guatemala, Haiti, México, Nicarágua, Panamá, Peru, Salvador, Uruguai e Venezuela. Países da Ásia: Japão, Turquia e Sião – reino atualmente conhecido como Tailândia; só como termo de comparação, lembremo-nos que hoje há apenas doze consulados no Porto); Correio, telégrafo e telefone (com a central na Batalha, onde agora está o hotel NH Collection); Creches; Dispensários; Distâncias quilométricas do Porto (secção que ocupa umas vinte páginas, não incluindo apenas localidades portuguesas, mas também Vigo e Zamora, por exemplo); Escolas oficiais; Estações de caminhos de ferro; Faculdades (Ciências, Engenharia, Farmácia e Medicina); Farmácias (são dezenas e estão dispostas conforme o dia da semana em que estavam de turno); Grémios; Hospitais; Inspeções; Institutos; Jardins e parques; Jornais e revistas (havia um total de 22 publicações periódicas, entre os quais Alma Académica, A Ordem, Boletim do Contribuinte, Diário do Pôrto, Gazeta das Aldeias, Portucale, Sporting, para além de O Comércio do Porto, O Primeiro de Janeiro – com sede em Santa Catarina, onde agora está o shopping Via Catarina – e o Jornal de Notícias); Juntas de freguesia; Lactários (i.e., estabelecimentos de beneficência onde se aleitavam crianças pobres); Liceus; Maternidades; Mercados (para além do Bolhão, havia o mercado do Anjo – onde hoje está o Passeio dos Clérigos –, o do Peixe – onde hoje está o edifício do Tribunal da Relação do Porto – e o do Gado – na Corujeira); Monumentos (sobre o monumento à Guerra Peninsular, na praça de Mouzinho de Albuquerque, indica-se “por concluir”); Museus (inclui o Salão Silva Porto, em Cedofeita, e Soares dos Reis, na época localizado em São Lázaro); Notários; Observatórios; Palácios; Polícias (havia vários corpos de polícia: administrativa, internacional – i.e., PVDE – investigação criminal, marítima e PSP, indicando-se as respetivas esquadras e postos, num total de 34 endereços – número que impressiona, se considerarmos que o concelho do Porto tem uma área que não vai além dos 41 km2); Policlínicas; Postos fiscais camarários (havia 14, nos locais de entrada da cidade, ou seja, na ponte Luís I e ao longo da estrada da Circunvalação); Postos de radiotelefonia (i.e., emissoras de rádio; havia sete, cada uma com o seu respetivo indicativo: CS2XK, CS2XI, CS2XE, etc.); Postos de radiotelegrafia; Quartéis (havia na cidade nada menos do que treze aquartelamentos militares); Registo criminal e policial; Repartições oficiais; Sanatórios; Seminários; Serviços marítimos; Serviços militares (num total de dezassete, desde a Messe de Oficiais, à Casa de Reclusão, passando pelo Depósito Territorial de Material de Guerra e pelo Distrito de Recrutamento e Mobilização); Serviços municipalizados; Serviços de saúde; Sindicatos nacionais (num total de 42, eram instituições tuteladas pelo governo que integravam profissões tão variadas como as vendedeiras de leite e os profissionais de carnes verdes, aos empregados do comércio, arquitetos e farmacêuticos); Telefones; Templos (apenas são listados os católicos, alguns com uma breve descrição histórica e arquitetónica, caso dos Clérigos, da Lapa ou da Sé, entre outros); e, por fim, os Tribunais.
O comércio e a indústria do Porto
Segue-se o “Roteiro do Pôrto”, no qual se apresenta, por ordem alfabética, cada arruamento da cidade, indicando-se a freguesia e o bairro a que pertencia, onde começava e acabava, o número do elétrico que servia o local e a esquadra ou posto da polícia que supervisionava o dito arruamento.
A secção seguinte ocupa cerca metade desta publicação: “Comércio e indústria da cidade do Pôrto”. Trata-se de uma espécie de páginas amarelas avant la lettre. Está dividida por temas (por exemplo: Acessórios; Gabardines e lanifícios; Materiais de construção; Mercearias; Produtos químicos; Vulcanizações e recauchutagens; etc.), ordenados alfabeticamente, onde se listam as empresas de cada setor (com nome, morada, número de telefone e, em certos casos, também o endereço de telégrafo). Primeiro, elencam-se as empresas da cidade do Porto, depois as de outras localidades do distrito do Porto, com destaque para Matosinhos e Vila Nova de Gaia.
Na internet, encontrei muito pouca informação sobre o Indicadôr de utilidade pública: Pôrto, 1939, pelo que desconheço se contou com outras edições, antes ou depois de 1939. Muito possivelmente, no seu tempo, este terá sido um instrumento bastante útil. No entanto, parece-me que a inclusão de um desdobrável com uma planta da cidade poderia enriquecer esta publicação, nomeadamente a parte relativa ao roteiro do Porto.
Hoje, esta publicação funciona como uma valiosa fonte de informações sobre a vida quotidiana no Porto no ano em que se iniciou a Segunda Guerra Mundial. Pela sua consulta, conseguimos vislumbrar como vivia o portuense em 1939: onde ia almoçar ou jantar, que cafés frequentava, que jornais e revistas lia, onde comprava uma gabardine, que emissora de telefonia escutava, onde engraxava os sapatos, onde cortava o cabelo, a que cinema ou teatro ia, onde podia apanhar uma “camionete” para Águeda, Guimarães, Marco de Canaveses, Grijó ou Lisboa, etc., etc.
Ficha técnica
- Título: Indicadôr de utilidade pública: Pôrto, 1939
- Edição: 1939
- Idioma: português
- Editor: Agência Fulmina
- Local: Porto
- Encadernação: capa mole
- Estado de conservação: Exemplar estimado; capa com sinais de uso; miolo limpo.
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